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Consumo de leite baixou um milhão de litros por mês
Industria aponta o dedo a moda sem fundamento cientifico e avança com campanha
19 jan, 2018

Industria aponta o dedo a moda sem fundamento cientifico e avança com campanha

 

Alimentação Consumo está a descer desde 2008. Preocupada com "campanhas difamatórias", indústria está a distribuir folhetos informativos em supermercados

O consumo de leite em Portugal está a baixar desde 2008 e, nos últimos dois anos, caiu "bruscamente". Em 2016, foram vendidos mensalmente 36,8 milhões de litros. Em 2017, o número baixou para 35,5 milhões, ou seja, menos um milhão de litros por mês. A tendência de queda no consumo verifica-se em toda a Europa, mas é maior em Portugal. A queda regista-se em todos os produtos lácteos, mas é maior no leite. De tal forma que a Associação Nacional da Indústria dos Laticínios (ANIL) avançou com uma iniciativa de alerta "para as campanhas difamatórias do leite sem fundamentação científica".

"Sobretudo entre as faixas etárias mais jovens, há cada vez mais pessoas que não consomem produtos de origem animal e há também várias "modas" que, talvez por uma questão de marketing, estão a demonizar os laticínios", afirmou ao JN Paulo Leite, diretor da ANIL.

"Queremos recordar os consumidores de que o leite é um alimento rico em proteína, cálcio e vitaminas e que está a ser estigmatizado por causa das contradições que existem quanto ao seu consumo e que não devem alinhar em dietas ou regimes alimentares que excluam os laticínios", frisou.

Vendas baixaram 11% em 2016
Em termos financeiros, as empresas de laticínios sofreram uma quebra nas contas. Em 2015, o leite representou uma fa- turação de 287,9 milhões de euros. Em 2016, as vendas baixaram para 257,4 milhões (menos 11% do que no ano anterior) e, em 2017, o valor total rondará os 256 milhões de euros. "Estamos preocupados com a saúde e os hábitos alimentares dos portugueses", explicou Paulo Leite, não escamoteando que a quebra no consumo, "obviamente se reflete na indústria".

Paulo Leite acredita, contudo, que "o consumidor português é um consumidor informado, que toma decisões conscientes sobre a sua alimentação e que não vai aderir a campanhas difamatórias e sem fundamentação científica robusta". Para a ANIL, o decréscimo no consumo não representa uma mudança de hábitos alimentares, mas "apenas uma moda ou uma tendência" que, nos últimos anos, é sentida por todas as empresas de laticínios.

Maior queda entre 2012 e 2016
Com base nos números disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística da balança alimentar portuguesa (BAP), verifica-se que até 2003 o consumo de produtos lácteos aumentou todos os anos. Entre 2008 e 2012, pela primeira vez no registo do consumo em Portugal, houve uma redução de 4%. A maior queda aconteceu entre 2012 e 2016: em todos os alimentos feitos com leite, o consumo baixou 9,3%. A BAP mede o consumo alimentar do ponto de vista da oferta ou disponibilidade de alimentos no mercado. Ou seja, apesar de existirem produtos lácteos nos supermercados, os consumidores optaram por não comprar, reduzindo o consumo em quase 10%.

Para "inverter tendências", os empresários do setor decidiram disponibilizar nos locais de venda folhetos com informações "científicas". "A ciência demonstra que para uma alimentação saudável e equilibrada, os laticínios devem representar 18% da pirâmide alimentar, o que corresponde entre duas a três porções diárias entre leite, queijo e iogurte", salientou o responsável pela ANIL.

Entre as várias medidas concretas que os empresários pretendem realizar para acabar com o que dizem ser uma "campanha difamatória e sem fundamentação científica", querem impedir que "bebidas de soja, amêndoa ou arroz" sejam associadas à palavra "leite" e que, nos espaços comerciais, deixem de estar disponíveis nas prateleiras contíguas às do leite.

Registo:
71 quilos de leite por habitante foram consumidos, em média, pelos portugueses em 2015 segundo o INE, o número mais baixo dos últimos 32 anos.

Hábitos alimentares

Bebidas vegetais aumentam
Há quem lhe chame leite, mas é mais consensual o termo "bebida". Enquanto o consumo de leite de vaca tem vindo a diminuir ao longo dos últimos anos, aumentou (embora sem número oficiais) o consumo de bebidas vegetais entre bebés, crianças e adultos. Arroz, soja, aveia, espelta, amêndoa e coco são as bebidas mais vendidas. Há quem lhes junte chocolate, café ou cereais. E são também cada vez mais usadas na culinária. Para separar as águas, a indústria não quer que estes produtos estejam à venda na zona dos leites.

DGS recomenda ingestão diária
A Direção-Geral de Saúde (DGS) coloca o leite no topo dos alimentos necessários para uma alimentação saudável. O elevado valor nutricional, o cálcio, a vitamina B12, o fósforo e o iodo, bem como as restantes vitaminas e minerais, fazem com que a DGS recomende a sua ingestão diária.

1500 supermercados
aderiram à campanha nacional para a promoção dos benefícios do leite e laticínios, com o apoio da Direção- Geral da Saúde e da Associação Portuguesa de Nutrição. Estão a ser distribuídos milhares de folhetos.

12 quilos de queijo
por ano são consumidos, em média, por cada português. A indústria garante que consumo aumentou 2%. Embora sem números exatos, os industriais constatam uma quebra que ronda os 3% na venda de iogurtes.

Carla Lopes
Prof. Fac. Medicina do Porto, Investigadora Inst. Saúde Pública

"Não há qualquer lógica na recomendação de não beber leites"
E uma surpresa a diminuição do consumo de leite?
Infelizmente, não. Há uma tendência nos últimos tempos, uma moda, entre algumas correntes de profissionais de saúde, em desvalorizar o consumo de leite. Apareceram no mercado produtos que se apresentam como substitutos do leite, mas que não o são, porque o leite é insubstituível.

E essa "moda" surgiu por alguma razão especial?
Penso que por questões de marketing. Não há qualquer evidência científica que desaconselhe o consumo de leite. É um alimento barato, com muita qualidade e fortíssimo, por exemplo, em cálcio. Não há qualquer lógica na recomendação de não beber leite e é absolutamente importante que crianças e idosos consumam, nas quantidades indicadas para cada pessoa, leite diariamente. Leite ou produtos lácteos.

Há exceções?
Apenas nas pessoas que são intolerantes à lactose. É preciso muito cuidado com as dietas da moda, porque podem privar o organismo de bens essenciais. As bebidas de soja, arroz, amêndoa e afins não são leite. São bebidas que até podem ser ricas em nutrientes, mas que ninguém as confunda com leite.

FONTE: Jornal de Noticias